quinta-feira, 1 de outubro de 2009
O BBB e o êxtase do consumo
Eu não sei quanto a você, mas uma coisa que tem me irritado na ultima versão do BBB9 foi sua transformação em instrumento de marketing. De forma pornográfica, transformou-se num lugar de venda de tudo, de refrigerantes à tinta, de celulares à produtos de beleza. Essa exposição excessiva da mercadoria provoca uma certa náusea no telespectador, uma sensação de mal-estar que merece um olhar atento do espectador crítico. Se não, vejamos.
Se fossemos resumir a história podemos dizer que havia um “contrato” original na elaboração da programação da televisão. Ela nunca negou que estava ali para vender mercadorias e nós nunca a rejeitamos por causa disto. Mas a TV inventou uma forma de resolver isto, inventando o que chamamos de “intervalo comercial”, o lugar respeitoso no qual produtos são anunciados a exaustão. Você tinha o direito de ver um programa, desde que aceitasse seus intervalos, a propaganda de seus anunciantes, nada mais justo já que pagam para que vejamos tais programas, e muitos são bons mesmos, e para isso apenas cobram o preço de nos obrigar a ver suas propagandas. Não é o pior dos mundos se formos pensar bem, e poderíamos dizer que, aliás, é um interessante acordo de cavalheiros. Aceitamos ver propagandas para termos acesso a diversão. Tudo bem.
Esse espaço criou inclusive, como consequência, programas de televisão especializados em intervalos comerciais. Vemos que há comerciais divertidos, inteligentes, bem feitos, tecnicamente apurados no Brasil e no mundo. Comercial pode ser cultura – claro, com limitações. Isso também diverte e tem sua razão de ser. Propaganda vai existir sempre, mas não seria um bom momento de que houvesse uma reflexão sobre ela, sobre seus limites no espaço da programação, da mesma forma que refletimos sobre a excessiva participação de artistas em campanhas publicitárias de cerveja, ou mesmo a necessidade de fazer ações radicais, quando for o caso, como o que foi feito com propaganda de cigarro?
Num certo momento, o espaço do “intervalo comercial” se saturou e teve sua eficácia reduzida. Cansamos de dar atenção ao excesso de propaganda, descobrimos que poderíamos nos distanciar, apenas um pouco de nosso dever obrigatório para com os anunciantes. A televisão entendeu um pouco isso, e inventou o “plin-plin” como que nos dissesse – não vá perder seu programa preferido, se você estiver por perto. Ao ouvir o sinal saímos da cozinha, do banheiro, voltamos ao tempo mágico da sala de jantar. Somos bem criados para isso, como explica o behaviorismo.
Não seria errôneo afirmar que, com o tempo, os anunciantes ficaram mais “gulosos”. A concorrência, a luta pelo mercado, tudo enfim deu o impulso para a quebra do acordo de cavalheiros original, e aí, a propaganda tomou uma decisão perigosa e invadiu sem limites o interior da programação da televisão – é bem verdade que propaganda sempre esteve no meio dos programas, va lá, mas surpreende a ausência de limites entre dramaturgia e propaganda e a intensidade de sua ocupação. Isto é novo.
O que deveria servir para incentivar a criatividade no espaço publicitário levou a uma transformação das regras na mídia em larga escala. E eu diria, pornograficamente, de forma obscena – em seu sentido original. Na quarta-feira, quem assistisse ao BBB9 na NET veria toda uma ambientação de festa em função da mercadoria. Você não tem como esconder – a sensação é que você está sendo enganado, e perversamente enganado por um produto de propaganda. Você poderá dizer – ah, eles estavam se divertindo, aquilo ali é já um espaço artificial, eles e nós sabemos disso, etc, etc. Você poderá dizer também que programas de televisão não tem obrigação com a função educativa e cultural, ainda que seja meritório quando o fazem, e a televisão nunca negou que nasceu para o entretenimento, em primeiro lugar. Mas é deste ponto de vista que tais programas podem ser criticados - isto é entretenimento?
É claro que sabemos que produtores, equipes, técnicos, todos enfim, se esforçam por um produto de qualidade. Ele pode não ter função social alguma – o que não é o caso – seja educativa ou de formação cultural, mas mesmo assim ela servirá no mínimo para que as pessoas, ao menos, conversarem entre si no dia seguinte e torne a vida, por esta razão, mais humana. Mas o que queríamos dizer é que não custa nada, como diz o adolescente, dar uma “maneirada geral”, ou como diz o cirurgião, “tirar só o excesso” para que não se fique com a impressão de que alguma coisa está fora do lugar. A conseqüência será evidente – já há muito desencanto por aí – com a política, com as instituições. A TV deveria saber que se continuar assim estará trilhando um rumo sem volta na atenção do telespectador. Arrisco até a dizer que ela corre o risco de perder espaços para a internet, que já possui seus canais de tv e um propaganda ainda administrada. Mas isto, é claro, é pura escatologia. Mas aí, é outra história.
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