segunda-feira, 28 de março de 2011
Aniversário de Porto Alegre
sábado, 19 de março de 2011
O dia internacional da mulher e o carnaval
Se não vejamos. Como se sabe, a data é referência ao dia 8 de março de 1857, quando operárias de uma fábrica de tecidos de Nova Iorque fizeram uma grande greve para reivindicar melhores condições de trabalho. Redução na carga diária de trabalho para dez horas, já que as fábricas exigiam 16 horas, equiparação de salários das mulheres com os homens e principalmente - isto é fundamental - tratamento digno dentro do ambiente de trabalho. A manifestação foi reprimida com total violência e as mulheres foram trancadas dentro da fábrica, que foi incendiada. Com a data, entre outras coisas, além de debates, busca-se combater tudo o que desvaloriza a mulher.
O Carnaval desvaloriza a mulher? Para carnavalescos e o senso comum, ao contrário, é o lugar do seu espetáculo, festa onde as mulheres ocupam um lugar central. Ala das baianas, Porta-bandeira, mas principalmente passistas, muitas passistas, o que segundo seus organizadores “é a mulher brasileira oferecendo seu corpo à beleza da festa”. Espaço no qual invertem-se papeis sociais, como aponta a antropologia de Roberto Damatta, o fato é que desde que Pascal Bruckner e Alain Finkielkraut publicaram a obra A Nova Desordem Amorosa (Ed. Brasiliense, 1984) e Jean Baudrillard A Sedução (Ed.Papirus, 2001) , as coisas não foram assim tão simples.Bruckner & Finkiekraut apontaram que no Capitalismo, nada é mais natural do que o "mercado dos corpos", esse universo de avaliações que homens e mulheres fazem sobre si e sobre seus corpos mediados pela mercadoria. Baudrillard descreve o campo simbólico que envolve o feminino, para além do corpo e do sexo e que traz a tona o seu poder: "o homem detém o poder real, a mulher detém o poder simbólico”. Herdeiros do Maio de 68, a tônica é posta no desejo e não no corpo. O que eles querem criticar é o que traz para as relações humanas a ideologia do Capital "não há mercado maior do que a mesa de um bar onde corpos expõem-se para o olhar objetal do outro". Fim da troca, nascimento das relações de objeto.
Algo semelhante ocorre no Carnaval com a superexposição da mulher. A questão foi colocada originalmente por Georges Bataille em O Erotismo (LP&M, 1989): no abismo simbólico que separa o erotismo masculino do feminino, o feminino é superior, mas o masculino impõe sua hegemonia. Para Brucker & Finkielkraut, efeito da "maldição da descarga ligeira" (sic). O que ambos autores criticam é a vertiginosa lógica de exposição dos corpos das mulheres em nossa cultura, signo de uma sexualidade feminina construída para o deleite do olhar masculino. É a contradição do Carnaval em relação à mulher: não se pode olhar alegremente para a câmera e desvelar o corpo impunemente. O simbólico pede: um pouco de pudor, por favor!(Baudrillard).
Azar é azar, mas não se deve aceitar a coicidência sem refletir. No século XIX, tentou-se silenciar as mulheres queimando seus corpos. Hoje aceita-se sem pensar que o Dia da Mulher e as festividades do Carnaval possam ser conciliados - queima-se uma idéia.Dia da Mulher? Ôba, onde estão as mulatas?
segunda-feira, 14 de março de 2011
Sobre ciclistas e carros
Para o autor de “Fé em Deus e Pé na Tábua ou como e porquê o transito enlouquece o Brasil”, o problema é que o brasileiro não aceita a igualdade. O trânsito obriga você a esperar sua vez. Para DaMatta, ao contrário, no trânsito o motorista se sente um aristocrata e o antrópologo enumera uma série de caracteristicas que fazem com que afirme que o problema está nas pessoas: nossa formação, individualismo, cultura, etc. Uma outra interpretação, contudo, aponta para seguinte direção e diz: o problema está na coisa. Para André Gorz,em "Ecológica" os carros são como os castelos,bens de luxo inventados para o prazer de uma minoria. Se todos tem, todos se frustram com eles, ao contrário das bicicletas, feitas para todos. Por esta razão o carro é um bem anti-social, porque rouba o espaço dos pedestres e ciclistas, e desumanizante, pois a posse da velocidade reforça o nosso egoísmo e induz a violência.
Para Paul Virilio, a velocidade é o centro da dromologia, a ciência da velocidade (dromos= corrida). Quando foi inventado, o carro proporcionou a experiência inédita de andar mais rápido que diligências, carruagens, trens e bicicletas. Antes dele, a velocidade era democrática: todos andavam na mesma velocidade. Depois do carro, havia uma velocidade de deslocamento para a elite e outra para o povo. Aparentemente, o carro dá poderes ilimitados ao seu dono, mas o que faz de fato é torná-lo dependente de mecanismos de manutenção dos especialistas, que cobram caro por seus serviços. Enquanto que o ciclista tem relação de possuidor de sua bicicleta, o motorista é consumidor. Vitória do Capital, que cria dependência sob o véu de autonomia.
Ao democratizar-se o privilégio, caímos numa armadilha. Queríamos velocidade privilegiada e voltamos a andar na velocidade média das carruagens e dos ciclistas. Diz Gorz: “enquanto houver cidades, o problema não terá solução”, referindo-se ao fato de que não adianta quantas estradas sejam construídas que sempre haverá mais e mais carros para nelas trafegar. Estudiosos dizem que gastamos uma hora de trabalho para andar seis quilômetros, o mesmo que faríamos a pé. E quanto mais carros rápidos fazemos, mais tempo perdemos para nos deslocar.
Para Gorz, o carro mata duas vezes. Mata primeiro a cidade, tornando-a insuportável. Mata depois a si mesmo, negando sua essência, a velocidade. Mas o que Gorz não imaginou, é que mata também um pouco de nós mesmos, basta ver as cenas diárias de violência banal no trânsito. “O carro tornou a cidade inabitável” diz Gorz, e por isso sentimos a cidade como um inferno. O que resta da finalidade original do carro quando, em termos de velocidade, uma bicicleta pode fazer igual?
DaMatta e Gorz estão certos: o problema não é o transporte, mas o tipo de cidade e vida que desejamos ter. Precisamos renunciar ao carro, transformar a paisagem urbana, fazer com que as pessoas não precisem mais de transporte e que tenham prazer em ir de bicicleta ou a pé para o trabalho. Deve ser agenda dos políticos e urbanistas o problema de como fazer com que bairros possam se transformar no microcosmo de nossa vida. Se o problema do transporte está ligado ao problema da cidade, da divisão do trabalho e da compartimentalização da vida, faz sentido a resposta de Marcuse sobre o que fazer depois da Revolução. Ele disse: “nos iremos destruir as cidades e reconstruir novas. Isso nos ocupará por um tempo”.