domingo, 25 de outubro de 2009

Atualizar o pensamento de esquerda



Em maio de 1998, foi realizado em Paris um encontro internacional em comemoração aos 150 anos da publicação do Manifesto Comunista de Marx e Engels. O encontro reuniu tudo o que a direita mais odeia: leninistas, stalinistas, trotskistas, conselhistas, autonomistas, luxemburguistas, maoístas, gramscianos e guevaristas, todos fazendo referências a K. Marx. Dez anos depois, no Brasil, em 2008, a esquerda brasileira voltava a discussão do mesmo manifesto, com os mesmos atores políticos do encontro francês. O que diferencia um e outro grupo, no entanto?

A reunião foi relatada por Daniel Aarão Reis Filho, em artigo do Jornal da Tarde. Lá fora, reconhecia-se que a esquerda está mudando, e o congresso foi uma troca ponderada de reflexões como nunca se viu: estavam presentes 1.500 pessoas, provenientes de mais de 60 países, que dividiram -se em 37 mesas-redondas envolvendo 280 participantes. Foram apresentados 349 textos e participaram 60 brasileiros com a apresentação de 31 papers. O evento foi organizado pela Espaços Marx e bancada por mais de duzentos intelectuais. Algo bem diferente do que se viu aqui: seminários esparços em instituições politicas, papers na internet, seminários sindicais e de partidos buscaram levantar o mesmo tema, de uma forma mais restrita.Renovar, pero no mucho, camaradas. Pelo menos uma diferença fundamental: a capacidade concedida aqui e lá para aceitar a necessidade de atualizar os objetivos do manifesto. Mais lá e menos aqui.


Porque atualizar os objetivos do movimento de esquerda é uma necessidade. E a direita sabe muito bem usar do esgotamento dos ideais de esquerda. Há na televisão, uma propaganda de um partido de direita, que diz que o "jovem não quer ser de esquerda, não quer usar camisa de Che Guevara". Porque? Por que essa direita sabe que o jovem não lê os clássicos, muito menos o Manifesto Comunista lhe serve de orientação. O que é um problema, pois ali está justamente as grandes questões políticas que gostariamos de ver os jovens refletirem:o que resta para propor alternativas políticas e em que direção? Como fazer a mudança social? Com quem se deve aliar? Revolução é possivel ou é o sonho do século passado?


Enquanto que lá fora, existem intelectuais que querem revisar o que Marx disse a luz de outras linhas de pensamento, aqui ainda há muito, de uma esquerda que não querem revisar o que Marx disse ou escreveu, nem atualizam as experiências socialistas. Não querem o revisionismo. Essa tendência é bastante forte no Brasil. É o discurso que não abandona a idéia do proletariado como classe revolucionária, a idéia de partido como vanguarda, a defesa da violência( presente hoje no MST), a idéia da revolução anticapitalista. E por causa desta fixação da esquerda, perde-se cada vez mais o alcance dos jovens.

Por isso, o encontro de 1998 tem mais a ensinar a esquerda do que a discussão no Brasil dez anos depois. Marx precisa ser revisado, urgentemente. As questões são as novas alternativas capitalistas no século XX. Pergunta-se por novos atores, novas formas de luta, principalmente sem o uso da violência. O que queremos deixar claro é nossa idéia de comprometimento da luta social e política com a democracia e os valores democráticos, e nesse aspecto é preciso que a esquerda precisa cortar na própria carne: é a rejeição da herança leninista.

É claro que há aqueles, finalmente, que desejam uma revisão limitada - e não radical - do pensamento marxista. Consideram insuperável seu diagnóstico do sistema capitalista atual - com o que concordamos, alienação, mais valia e tudo o mais. O problema é sua visão de futuro, que incapaz de atualizar para criticar o presente - o significado da expansão da alienação pelo capital, a conquista da subjetividade e as novas formas de micropoder, temas recorrente em Kurz e Zizek - perdem a oportunidade para pensar novamente a idéia de futuro.E futuro, para os jovens, precisa chegar mais rápido.


Sinal dos tempos: o comunismo fragmentou-se mas o pensamento de Marx continua a explicar o capitalismo. Há na esquerda desde a defesa do pluralismo ao radicalismo mais tacanho, o que ainda é uma grande ameaça. É a imagem patética de esquerda que vemos no horário eleitoral. Ela tem que mudar. Não há nada errado em lutar por um ideal socialista, mas a experiência de terror manda respeitar as diferenças regionais e aponta que o caminho é aquele em que buscamos a utopia mais próxima da realidade possível. Construir um novo discurso de esquerda possível é fundamental para trazer para o movimento político os jovens, cada vez mais afastados da política. Porque , sem jovens, como será o futuro da esquerda?

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