Zero Hora do último domingo fez uma extensa matéria sobre
a Câmara Municipal de Porto Alegre. Para conhecer o que a Câmara faz recomendo
a leitura de “Dez Anos de Leis e Ações Municipais” obra lançada pelo Legislativo
no ano passado com quase trezentas páginas nas quais pode ser visto exemplos do
trabalho dos vereadores e suas ações na construção de políticas públicas na
cidade. Ela é distribuida gratuitamente pela Câmara Municipal. Vá lá e pegue seu
exemplar, é grátis.
O ponto de partida da matéria é que o Plenário é uma sala
de aula. Não, não é, não no sentido ali atribuído. Você até pode usar a
comparação para explicar o funcionamento do plenário para crianças,
mas ela não cabe numa matéria à altura de ZH. O plenário é o
espaço de debates superior da cidade. No seu interior a produção de legislação
responde a necessidade que nossa sociedade tem de pré-selecionar sua agenda de
opções, numa palavra, o que pode e não pode fazer. Os vereadores fazem escolhas
no plenário antes que os cidadãos possam fazê-las e a legislação produzida ali
separa o reino da viabilidade prática do das possibilidades teóricas dos
cidadãos. Quer dizer, estabelece o conjunto de restrições que os individuos
necessitam seguir na sociedade para viver melhor. Não há nada nisso que lembre
uma sala de aula.
O problema da comparação é que ela corre o risco de
suscitar no leitor aquilo que Jacques Ranciére denominou de “ódio `a
democracia”: ela incita no cidadão a idéia de que, se nossos vereadores são
capazes de perder todo o seu tempo com “bobagens”- o que reputo, não é verdade -
é porque eles não merecem o nosso respeito, primeiro passo para o nascimento do
sentimento de ódio para com nossas instituições. O problema da comparação é
sugerir ao leitor que a socialidade politica - a presença da ironia e da
brincadeira – seja a própria natureza da vida do plenário, e não é. A natureza
do plenário é fazer leis para a sociedade. O "papo jogado fora", na expressão de
Michel Maffesoli, ocorre ali como em qualquer instituição - inclusive na redação
de ZH - e tem a função de tornar sólidos os vínculos entre os atores,
nunca substituindo a sua função principal.
Paradoxalmente, a matéria atirou no que viu
e acertou o que não viu. É que, se a metáfora da sala de aula pode ser objeto de
crítica, a necessidade da educação no parlamento é uma certeza. E há inúmeras
ações que o parlamento faz para que o cidadão possa conhecer suas leis, seus
direitos e que a matéria poderia ter ilustrado e não o fez. As instituições
políticas vivem hoje um processo de valorização de seu papel educativo: “na
Câmara que você não vê”, ações dão testemunho que o legislativo vem cumprindo
seu papel de colaborar na educação da sociedade para a política: através do
atendimento de escolas, realização de cursos, seminários, exposições,
publicizando seus gastos e todas as etapas do processo legislativo - via
internet - é que a Câmara assume o seu papel educativo em seu campo de
influência. O plenário é uma sala de aula sim, mas não no sentido sugerido pela
matéria, mas pelo ato educativo que ocorre cada vez que há participação da
comunidade no seu interior. A matéria descreveu ricamente tais processos no
âmbito das comissões, mas ficou-nos devendo a descrição de tais processos no
plenário - e eles ocorrem. Ali, no espaço da política em estado
puro, comunidades inteiras aprendem a fazer política na prática. Nesse instante
sim, transformam o plenário numa sala de aula – na sua melhor concepção. O
plenário é um pedagogo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário