domingo, 25 de outubro de 2009

Para uma ética política voltada para o futuro



Voltaire, um dos expoentes do Iluminismo, dizia que existe apenas uma moralidade, da mesma maneira que existe apenas uma geometria. Tempos depois, Paul Valery dizia que no mundo dominado pela especulação, nossa concepção de valores morais tende a aproximar-se do modelo de valor dos mercados de ações.


As palavras de Paul Valery servem para definir com exatidão o que está na base da crise de valores que vivemos hoje: ela envolve envolve estruturas morais tradicionais e valores laicos, como a verdade e a mentira na política. Ele está cada vez mais marcado pela lógica dos valores de mercado aplicada a vida políticam, o que leva os políticos a levar em conta cada vez mais os indicadores temporários que favorecem a frivolidade do que os verdadeiros valores políticos que devem nortear suas ações.

Vejamos mais uma vez o exemplo de Yeda Crusius. A governadora foi apanhada nesta estranha contradição de ser uma brilhante economista cuja atuação acadêmica a levou a conquistar um espaço político importante e ser uma política com um mandato marcado pelo efeito do efêmero e do frívolo: saber quando construir uma casa ou saber escolher um vice-governador deveriam ser questões menores para quem queria ser uma governadora e não foram. As contradições não demoraram a emergir: quando foi acuada pelos professores Yeda Crusius afirmou que estava em sua residência - deveria ter se lembrado disso quando encontraram faturas de bens adquiridos para sua casa particular. Foi neste instante que a governadora perdeu a razão de defender sua privacidade.


O fato é que ao invés de criar valores com sua ação política, Yeda Crusius os destrói por meio dela. Pior, destrói o sentimento da população em encontrar a verdade em seus governantes. Para a população, fica o fato de que se a casa da governadora pode ser financiada com recursos públicos, ela pode ser lugar de manifestações públicas. Melhor seria se o atual governo baixasse de uma vez para todas: casa do governador é o Palácio Piratini e ponto. Yeda Crusius não vê, mas encarna o divórcio entre a política e a intelectual porque é incapaz de com sua ação criar valores políticos, e com isso, nega a força propulsora que poderia dar ao seu partido. Isto é muito bom para a esquerda, pois torna seu trabalho de oposição muito mais fácil.


É possível Yeda Crusius recuperar-se deste erro político? Em muito países do mundo, o arrependimento de políticos chaves flagrados em momentos de fraqueza significou uma nova chance. Foi o que ela tentou fazer com seu discurso, após o encerramento da CPI da Assembléia. Mas é preciso considerar o efeito de sua ação no cimento social que une a sociedade e seus representantes. Se os gaúchos entenderem que a ação de Yeda Crusius é produto de um individualismo exacerbado, argilosamente preparado desde o momento de sua candidatura ao Governo do Estado, seu partido perderá duas vezes: perderá uma política com uma história respeitável e seu tempo político de governo. Se a sociedade reconhecer nas desculpas singelas de Yeda, uma decisão genuína e de valor, novos tipos de solidariedade de centro-direita poderão nascer ao redor de seu nome, mas na minha modesta opinião, isto é muito mais dificil. Por esta razão, resta à esquerda iniciar a construção de uma candidatura ao governo de Estado vacinada na fonte, olhando com atenção os erros de sua adversária, sem qualquer traço semelhante que possa fazer se arrepender.


O erro de Yeda Crusius foi não pensar as consequências sobre o futuro dos valores políticos que seu gesto simples de comprar uma casa provocaria na política local. Pois o político deve fazer reflexões éticas de seus atos, não apenas para o presente, mas em direção ao futuro. Deve pensar os valores e as consequências de suas ações no tempo. Ao desconsiderar uma ética voltada para o futuro, Yeda Crusius construiu com suas próprias mãos seu destino político. Nele agora três novos conceitos são associados: irrresponsabilidade política, revelada por atos que mostram sua indiferença frente a decisão soberana dos cidadãos que a elegeram governadora; imprevidência política, por que a imagem do bom político corre o risco de desaparecer com o vento devido as suas más ações; negação da herança política, por que por mais extensa e com contribuições de valor que tenha feito ao Estado em sua gestão, a imagem que fica para os eleitores é a de um governo não atendeu as expectativas da população. Que os candidatos a governador pensem na ética do futuro, é a lição que Yeda Crusius deixa a seus adversários.

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